quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A MINHA PRIMEIRA PAIXÃO AFRICANA – UMA BONECA

Ainda refletindo sobre a importância do Brincar, gostaria de vos contar um segredo: um dos brinquedos que marcou a minha vida foi uma boneca, mas não era uma boneca qualquer: era uma boneca negra. É mesmo isto – foi a minha primeira paixão africana!
Ia religiosamente a casa de uma amiga de infância brincar com esta boneca. Linda como nenhuma outra que eu tivesse. As brancas, claro está! Muito normalizadas, muito iguais entre si, sem nada que me pudessem entusiasmar.
Mas, com esta boneca era diferente. Não era minha e tinha o encanto, único e fundamental de ser negra. Fantasticamente bela! Toda negra, cabelo negro, pele negra – tudo nela tinha um sabor especial na brincadeira.
O que é certo é que não era minha e no meu percurso nunca tive uma boneca negra que fosse minha. Frustração é o que é!
Só me lembro que todas as roupas, o vestir e despir, o cuidar desta boneca eram momentos únicos. E, era ponto assente de cada vez que ia a casa da minha amiga – brincar com a sua boneca negra. Todas as minhas mais preciosas bonecas brancas ficavam de lado ou eram trocadas por esta paixão.
Passaram muitos anos! Encontramo-nos periodicamente nos jantares das Amigas de infância e lembrei-me de perguntar à detentora da boneca (para não dizer dona que só fica mal e pode ser mal interpretado quando se trata de variações de cor de pele), perguntei, dizia eu, à dona da boneca – que é feito? Ainda a vês ? Como está ela?
Perguntas que se podem fazer a um antigo amigo, neste caso, amiga.
E, tal como os amigos que não nos cruzamos há muito, mas que temos um lugar no coração, muito bem guardado, que só nós sabemos localizar, ela respondeu-me:
“ Está comigo, continuamos a ver-nos! Está óptima e, às vezes falamos de ti e quer saber como estás, a menina loura que tanto brincava com ela…”
Calei-me e não quis saber mais nada. Não quis tornar pública esta minha primeira paixão africana.
Afinal, não sabia o que a boneca poderia ter contado!

Até breve!
Célia Gandres     
Psicóloga Educacional

4 comentários:

  1. Como gosto de te ler! E fizeste-me recordar as doces memórias das minhas bonecas negras! Eu tive a sorte de as ter!

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  2. Partilharmos memórias, bonecas negras e brancas ou azuis, permite-nos continuar neste nosso Caminhar... o das Crianças!! Célia Gandres

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  3. Estava aqui a navegar pelo tema das "paixões africanas" quando descobri este texto. A nossa boneca (lembras-te do seu cheiro maravilhoso a chocolate?) foi também a primeira das minhas sucessivas "paixões africanas" que se multiplicam exponencialmente três décadas depois das nossas brincadeiras. Brincar é fundamental, sobretudo com amigos como tu.

    A amiga da boneca africana (ansiosamente à espera de saber se vai ou não para África este ano).

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  4. Oh Amiga, que bom teres encontrado este texto desta forma espontânea, tal como eram as nossas brincadeiras! A vida, por vezes, surpreende-nos, e esta é um maravilhoso presente de começar o ano. Beijinhos para as duas e boa sorte para África! Vou lá ver-te... Fico com o seu cheiro a chocolate, como nenhum outro!

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